Comunicação que nasceu da ordem de silêncio

Por João Paulo Aquino

Ditadura militar instaurada, ano de 1967, em pleno regime do general Costa e Silva, decide-se criar um curso de comunicação social. Publicidade e Propaganda, Cinema e Jornalismo constroem um paradoxo na história do Brasil, passavam a ser os novos cursos oferecidos pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Entre vigias e vigiados, censores e censurados, nasce o Instituto de Arte e Comunicação Social – o IACS.

Dois anos antes, o curso de Cinema da Universidade de Brasília (UnB) fechava-se: 15 professores são demitidos e outros pedem demissão em solidariedade aos perseguidos, em protesto contra o sistema que se consolidava. A liberdade de expressão estava ameaçada e comunicar não é mais sinônimo de dizer o que pensa.

O professor Nelson Pereira dos Santos se inclui entre os desalojados com o fim da graduação na UnB. Ele se muda para Niterói, a fim de traçar diariamente seu caminho pela ponte até o Jornal do Brasil, seu novo empregador. Em uma conversa com a professora Marta Reis, então assessora do reitor da UFF, ele fica sabendo da possibilidade da instituição receber um prédio de frente à praia, onde o governo federal tinha fechado um cassino – lugar da atual reitoria.

“A notícia deu ânimo para o Nelson e ele, junto a outros jornalistas como Zuenir Ventura, começou uma campanha para que o prédio fosse doado à Universidade. Mas do outro lado havia os proprietários, um grupo de espanhóis, e o Jornal O Fluminense, que pedia o cassino de volta. Isso era em 1966, Dutra tinha proibido o jogo de azar, mas Costa e Silva não tinha assumido ainda - e se sabia que ele gostava de jogar. Esse segundo grupo tinha a esperança que o cassino fosse reaberto”, conta o professor Antônio Serra, que está na universidade desde 1972 e lecionava no curso de cinema até 2007.

O prédio foi doado à Universidade. Desde meados da década de 1960, o mercado estava em busca de jornalistas e publicitários, um “boom” de novos cursos era assistido no País motivado principalmente pelo baixo investimento e pelo interesse dos alunos em seguir as novas carreiras. Nelson propõe ao reitor Manoel Barreto Netto a criação dos três cursos: Cinema, Jornalismo e Publicidade e Propaganda. Sua idéia era aprender fazendo, pois ele tinha experiência apenas com o Cinema.

As três novas habilitações juntaram aos cursos de Biblioteconomia e Arquivologia que já existiam e passaram a funcionar provisoriamente no prédio cedido pelo governo federal. Lá ficaram por dois anos e parte dos planos de Nelson se concretizou.

“Procurava-se montar um curso envolvido com a arte, por isso nesse tempo já construíram teatro, galeria de artes, editora - estruturas que funcionam até hoje no prédio da reitoria. O IACS se distingue de outras escolas como a ECO (Escola de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro) por esse envolvimento com a arte. Achou-se importante desde o começo ter cadeiras e professores da área de arte, muitas cadeiras de plásticas, de fotografia, perspectivas, história da arte. Isso permite aos nossos alunos um contato diferente com a tecnologia, além de dar um colorido ao nosso Instituto”, completa Serra.



Nos primeiros anos, o novo departamento arrebanhou professores de outras áreas como Sociologia e História. O engenheiro Roberto Duarte Castro (conhecido como "Babau"), trabalhava na Universidade e gostava de fotografia - foi o primeiro professor dessa disciplina. Outros professores foram trazidos de outras Universidade, como o da UFRJ Muniz Sodré de Araújo Cabral, hoje diretor da Biblioteca Nacional, e Fernando Barreto, do departamento de Arte da UnB.

“Os dois primeiros anos dos cursos eram básicos, todos os alunos estudavam juntos, a gente fundamentava as áreas de política, liberdade, verdade e ética. Depois cada um seguia uma formação diferente”, explicita o professor Serra.

Após dois anos de funcionamento no lugar da atual reitoria, o IACS mudou-se para o campus do Valonguinho, onde ocupou o quarto andar do departamento de Matemática e o subsolo. Em 1979, o Instituto foi deslocado para a atual unidade: o casarão situado à rua Lara Vilela, em São Domingos.

O campus onde funciona o IACS abrigou o cônsul da Grécia, Othon Leonardos quando era sede do sítio de sua família. O prédio da faculdade de Economia também era propriedade dos gregos, a fachada copiada em uma viagem da filha do cônsul ao seu país de origem. O casarão, hoje rosa, data de 1840-45 e foi colégio feminino – Gymnasio Bittencourt Silva -, de 1926 até 1969. No campus de Economia, funcionava o colégio masculino. Antes de ser ocupado pelo IACS, a velha mansão abrigou os cursos de Ciências Humanas e Filosofia de 1969 até 1979, quando o ICHF mudou-se para o Gragoatá. Em cima do consultório odontológico ao lado do IACS, reside ainda um neto de Othon Leonardos.

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