Entre vigias e vigiados

Por João Paulo Aquino

O IACS nasceu em plena ditadura militar, em seus primeiros anos já sofria as conseqüências da censura. Porém, com criatividade e malícia, professores e alunos souberam burlar os sistemas e não deixaram que a aprendizagem fosse prejudicada. Junto à reitoria, funcionava a Divisão de Segurança e Informação (DSI), um órgão vinculado ao sistema de segurança dos governos militares e era instalado na maioria das intituições públicas. Nas universidades, por exemplo, a divisão era responsável pelos contratos dos professores e por investigar movimentos estudantis.

“Em nossas aulas, a gente sabia o que podia dizer e o quando tínhamos que calar. Usávamos muitas alegorias, metáforas e recomendávamos muita leitura com fundamentos teóricos. Havia um pacto entre o aluno e o professor”, diz o professor Serra que ingressou em 1972 e foi demitido cinco anos depois, voltando às salas de aula em 1980.

Naquela época, o professor, para ser contratado, precisava apresentar um certificado expedido pelo Departamento de Ordem Política e Social (DOPS) que comprovasse o não-envolvimento dele em manifestações contrárias ao regime e apresentar a DSI, documento informalmente chamado de "atestado ideológico".

“Com a fusão do Estado da Guanabara ao Estado do Rio de Janeiro, eu tive que pegar meu atestado no DOPS do Rio e não mais em Niterói. Lá, eu tinha a ficha suja, eu estava envolvido em movimentos políticos, então eu não consegui o atestado ideológico. Consegui o contato do diretor do DOPS, daí ele me falou que não podia me ajudar. Ele tinha ordens explícitas para fazer uma limpeza na UFF. Se eu estivesse tentando vaga para Petrobras ou outro órgão, ele até poderia ajudar”, conta Serra, que recebeu um boletim de demissão pelo reitor durante uma aula que lecionava aos sábados.

“Era uma aula das 8h ao meio dia. Eu já tinha começado, até que recebo a nota. Eu parei a aula por um momento, avisei aos alunos e continuei até que acabasse. Fábio Barreto, filho do Barretão (ex-reitor Manoel Barreto Netto), ficou inconformado. Foram várias demissões, foi um período terrível, alunos sumiram, outros morreram... A Cristina Serra, repórter da TV Globo, veio de transferência porque ela estava sendo perseguida no Piauí”, exemplifica Serra.

“Naquela época, o aluno tinha um vínculo maior com a Universidade. Daquele portão para dentro tinha preservação das liberdades, e aqui era o local de suas primeiras experiênicas autônomas, inclusive de sexualidade e drogas. Era aqui que se tinha acesso a determinados filmes e documentários, tinha uma aura, aquilo (filme) vinha em uma lata. O país viva a censura, então a gente ensinava a ler o que estava por baixo daquele texto e o aluno passava isso para os amigos, o pai e toda a família. Os alunos sabiam que era uma Universidade pública federal e que estavam entrando num espaço com extensões para o mundo”, explica Serra. Em 2007, ele deixou a direção do IACS para dar aulas na graduação em Filosofia, curso que ajudou a fundar na Universidade Federal Fluminense, em 2008.

Nenhum comentário: